Imediatamente, Nora McInerny notou diferenças fundamentais na forma como as pessoas responderam à pandemia de coronavírus.

Para alguns, o vírus mortal e as mudanças completas disso constituíram a “primeira grande coisa pela qual passaram”. Enquanto isso, McInerny e outros cujas vidas foram moldadas por luto, perda ou tragédia sabiam há muito tempo que “a vida é frágil e nosso ritmo neste mundo moderno é insustentável”.

O primeiro marido de McInerny, Aaron, morreu três dias antes do Dia de Ação de Graças de 2014, deixando-a para criar sozinha o filho, Ralphie. Ela tinha acabado de sofrer um aborto espontâneo. E havia perdido o pai menos de um mês antes.

Seu trabalho –como apresentadora do podcast “Terrible, Thanks for Asking” (“Terrível, Obrigada Por Perguntar”, na tradução livre) e autora dos livros “It’s Okay to Laugh (Crying Is Cool Too)” (“Tudo Bem Dar Risada – Também Está Tudo Bem Chorar”, na tradução”) e “No Happy Endings” (“Sem Finais Felizes”, em português”), entre outras memórias –reflete essas perdas, contrariando as pressões sociais para “viva, ria e ame” com franqueza, realismo e humor irônico.

Sua nova coleção de ensaios, “Bad Vibes Only: (And Other Things I Bring to the Table)” (“Apenas Más Vibrações: E Outras Coisas que Trago à Mesa”, na tradução”), oferece uma réplica cômica e cortante à “nossa cultura agressiva e opressivamente otimista” e “obsessão por autoaperfeiçoamento”.

O slogan “Good Vibes Only” (“Somente Boas Vibrações”) é “fofo para uma caneca, mas um padrão interpessoal bastante sinistro”, escreveu McInerny.

Aqui, ela sugere honestidade e insucesso como metas mais adequadas à realidade.

Esta conversa foi editada e condensada para maior clareza.

CNN: O que você espera que as pessoas tirem do seu trabalho?

Nora McInerny: Quero que meu trabalho possa diminuir as cobranças que pessoas se colocam. Temos tanta pressão intensa para alcançar e realizar diante de todo o sofrimento e luta da vida moderna. Você não precisa fazer nada além de ser uma pessoa decente e sobreviver.

O ano de 2021 foi o pior ano da minha vida desde 2014, quando meu marido, Aaron, morreu. Esta doença horrível [Covid-19] foi varrendo o nosso mundo e imediatamente as pessoas começaram a ver o “lado positivo” disso.

Lembro-me de estar sentada na minha sala, de pernas cruzadas, tentando descobrir como poderíamos trabalhar mais com menos recursos. Enquanto isso, as pessoas tentavam dar um brilho e inseri-lo em algum tipo de lição de autoaperfeiçoamento. Eu resisto a isso. Todo o meu trabalho tem sido uma espécie de pressão contra o complexo industrial otimista.

CNN: Como o perfeccionismo se relaciona com esse tipo de otimismo?

McInerny: A corrente que vai desde de crianças superdotadas para mulheres profissionais que superaram as expectativas está cheio de perfeccionistas. O que é um perfeccionista se não apenas uma pessoa que odeia a si mesma – que não consegue simplesmente aproveitar o ato de estar vivo?

A partir do momento em que Aaron morreu, senti que tinha que merecer meu lugar neste planeta – apenas fazendo, fazendo, fazendo. Eu tive que descobrir como ser uma pessoa digna. Quando um terapeuta me perguntou quem eu seria sem todos os meus empregos e títulos, eu o encarei sem expressão.

O livro é sobre existir nas contradições da vida moderna. Todas as pessoas na minha vida – exceto as poucas que não têm redes sociais – estão estrelando, produzindo e dirigindo seu próprio reality show para o consumo de principalmente estranhos, inclusive eu. Que mundo estranho.

Ficar acordado até tarde no celular pode afetar saúde mental e física
Isolamento social, em virtude da pandemia, piorou a qualidade de vida dos brasileiros, diz pesquisa / Foto: Torwaiphoto/Freepik

CNN: Você escreve: “Todo millennial sitiado e exausto que conheço fantasia sobre uma vida conectada a algo maior que Wi-Fi […] ansiando por um pouco de silêncio em um mundo que está constantemente gritando conosco a partir de pequenos retângulos em nossos bolsos”. De onde vem essa conexão?

McInerny: O que me ajudou é a honestidade e as histórias de outras pessoas, que me lembram que não estou sozinha.

Direi que a maioria na indústria de auto-ajuda são vigaristas que vendem milhões de livros apregoando o sonho de que você também pode fazer o mesmo quando a grande maioria das pessoas não pode. Há algo a ser dito apenas por ser realista.

As pessoas que tentam convencê-lo de “faça estes cinco passos rápidos e tudo ficará bem” são golpistas. Dizer “a resposta está dentro de você” cria a armadilha de que, se você não encontrar a resposta, deve estar com defeito.

Não estou falando aqui de profissionais e pesquisadores de saúde mental qualificados. Se eles disserem para você comer com atenção e sair e olhar para a grama por cinco minutos, faça isso. Sentar aqui, acariciar meu cachorro e não olhar o celular me ajuda. Tirar meu telefone da minha frente me ajudou, como tenho certeza que ajudaria a maioria de nós.

Cada geração acredita que nunca foi pior. Mas todo esse pavor e tédio existencial é uma resposta muito normal a um mundo insensível, onde bilionários estão tentando desocupar este planeta através de foguetes e nós estamos lutando por sucatas. Por que você não ficaria ansioso?

CNN: Que conselho você dá para as pessoas que lutam contra a maré de um otimismo que parece forçado ou falso?

McInerny: Faça o que puder fazer. A necessidade de dar o seu melhor em todas as situações é uma mentira vendida a você por um professor de ginástica, um treinador e o capitalismo. Não, você não deve a tudo 110%. Na verdade, você deve à maioria das coisas 70%, talvez até 60%. O mundo não exige a sua perfeição.

A segunda coisa é que você não é obrigado a ser um livro aberto. Nem todo mundo merece a verdade completa, mas você precisa encontrar pelo menos uma pessoa para quem possa contar toda a história – uma pessoa que saiba como é isso.

Este livro é uma coleção de ensaios. Os leitores não vão sair com cinco dicas ou truques. Não há dicas. Não há truques – apenas o negócio muito confuso de tentar ser uma pessoa em um mundo realmente difícil.

 

*Jessica DuLong é jornalista do Brooklyn, Nova York, colaboradora de livros, coach de redação e autora de “Saved at the Seawall: Stories From the September 11 Boat Lift” e “My River Chronicles: Rediscovering the Work That Built America”.

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